O debate sobre a transparência da Caixa de Assistência dos Servidores de Mato Grosso do Sul (Cassems) ganhou força e promete agitar o cenário político do Estado. A instituição, que administra mais de R$ 1,3 bilhão por ano, é agora alvo de fortes críticas, denúncias de má gestão e indícios de uso questionável de recursos.
Durante sessão na Assembleia Legislativa, o presidente da Abecams (Associação dos Beneficiários da Cassems), Jeder Fabiano, fez um discurso contundente e pediu a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a administração da entidade.
“A Cassems movimenta mais dinheiro que a Prefeitura de Dourados, a segunda maior cidade do Estado. São R$ 1,3 bilhão por ano, contra R$ 1,1 bilhão da prefeitura. É hora de abrir a caixa-preta”, afirmou Jeder, que representa centenas de servidores estaduais.
Segundo ele, o cotidiano dos beneficiários está marcado por atrasos em cirurgias, falta de insumos, negação de tratamentos e judicialização de casos — um cenário incompatível com o volume de recursos movimentado pela instituição.
“Não somos contra a Cassems, mas contra a falta de transparência. Queremos saber para onde vai o dinheiro que sai do bolso dos servidores”, disse o sindicalista.
Denúncias no plenário e pressão política
As declarações incendiaram o plenário. O deputado Paulo Henrique (PL) engrossou o coro, afirmando que a Cassems não presta contas com a clareza que se espera de uma instituição que lida com dinheiro público e contribuições compulsórias.
Segundo ele, há indícios de gastos desproporcionais com publicidade, que somariam R$ 50 milhões na última década, enquanto persistem queixas sobre atrasos de pagamento a anestesistas e falta de próteses em hospitais da rede.
“A Cassems arrecada mais que uma cidade inteira. São R$ 800 milhões tirados diretamente da folha dos servidores e quase meio bilhão repassado pelo Estado. Com tanto dinheiro, é inaceitável ver pacientes esperando meses por cirurgia”, criticou o parlamentar.
Paulo Henrique defendeu ainda que as assembleias virtuais da entidade sejam gravadas e auditadas, citando relatos de beneficiários que teriam sido impedidos de registrar votos contrários à gestão atual. Ele anunciou que vai propor um projeto de lei para tornar obrigatória a transparência integral em entidades de autogestão financiadas com recursos públicos.
Cassems reage e tenta conter desgaste
Em meio à pressão crescente, alguns deputados saíram em defesa da instituição. O deputado Paulo Corrêa (PSDB) lembrou pesquisa de satisfação que aponta 80% de aprovação entre os usuários, e classificou as denúncias como “injustas e desproporcionais”.
Já o deputado Zeca do PT, criador da Cassems durante seu governo, defendeu o modelo e disse que o plano é referência nacional.
“Antes da Cassems, os servidores eram humilhados no antigo Previsul. Hoje, o Estado tem dez hospitais administrados com recursos próprios. Isso é conquista, não problema”, afirmou o petista.
Apesar das defesas, o tom da sessão foi de tensão e desconfiança generalizada. O pedido de CPI deverá ser analisado pela Mesa Diretora da Assembleia Legislativa, com adesão de parlamentares que cobram auditoria detalhada e investigação completa sobre os contratos, despesas e repasses realizados pela instituição.
Servidores cobram transparência e fim do silêncio institucional
Entre os beneficiários, cresce a percepção de que a Cassems se afastou da base que a sustenta. Em grupos de servidores, relatos de dificuldade de atendimento, atrasos de cirurgia e negativa de cobertura se multiplicam. Para muitos, a CPI é vista como o único caminho para esclarecer o destino dos recursos e restaurar a confiança dos contribuintes.
“A saúde do servidor virou negócio. Queremos clareza, não discursos prontos. Se não há o que esconder, por que temer uma CPI?”, questiona um servidor ouvido pela reportagem.
A possível CPI da Cassems tem potencial para se tornar um divisor de águas na política sul-mato-grossense, podendo expor relações políticas, contratos milionários e a real situação financeira da entidade que deveria garantir o atendimento médico de milhares de famílias.
Enquanto isso, os servidores continuam à espera — não apenas de atendimento, mas de respostas.